Estabilidade Comportamental e Tratamento Psiquiátrico Contínuo: Uma Leitura Analógica com o Equilíbrio de Nash
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Em contextos de tratamento psiquiátrico contínuo com uso de psicofármacos, frequentemente observa-se um estado de estabilidade que, embora funcional em termos sociais e institucionais, não corresponde necessariamente ao bem-estar subjetivo do indivíduo em tratamento. Essa estabilidade, marcada por comportamentos mantidos de forma duradoura, pode ser compreendida, por analogia, como um tipo de equilíbrio de Nash — conceito proveniente da teoria dos jogos — em que nenhuma das partes envolvidas tem incentivo imediato para alterar sua estratégia, sob pena de enfrentar consequências consideradas piores do que a permanência no estado atual.
No caso do tratamento com drogas psiquiátricas, o comportamento do paciente (por exemplo, adesão passiva ao uso da medicação) é frequentemente sustentado por contingências de reforço que envolvem não apenas os efeitos farmacológicos, mas sobretudo as consequências sociais e institucionais associadas à não adesão: possíveis conflitos familiares, internações involuntárias, estigmatização ou perda de acesso a direitos condicionados à regularidade terapêutica. Do lado dos familiares, a manutenção da rotina com ausência de crises graves costuma ser reforçadora o suficiente para inibir questionamentos mais profundos sobre os efeitos subjetivos da medicação ou os desejos expressos pelo paciente. Quanto ao profissional de saúde mental, especialmente em contextos biomédicos tradicionais, a continuidade do protocolo medicamentoso representa um caminho seguro, respaldado por diretrizes e reduzido em termos de riscos legais e institucionais.
Esse arranjo gera uma acomodação mútua: cada agente social ajusta seu comportamento ao dos demais de forma a evitar rupturas no sistema estabelecido. Assim como no equilíbrio de Nash, qualquer mudança unilateral — seja por parte do paciente, da família ou do profissional — tende a ser evitada por envolver aumento de incerteza, exposição a consequências negativas ou reconfiguração de papéis. A estabilidade é, portanto, menos uma conquista ativa de saúde do que uma forma de “homeostase” comportamental funcional, cujo critério principal é a ausência de crise visível.
Ocorre, contudo, que esse tipo de estabilidade pode ser disfuncional do ponto de vista da autonomia, da expressão subjetiva e da qualidade de vida do paciente. Comportamentos de crítica ao tratamento, manifestações de desconforto com os efeitos colaterais ou tentativas de reorganizar a vida sem o uso contínuo de medicamentos muitas vezes são extintos, punidos ou desvalorizados, dificultando a emergência de novos repertórios. A mudança, quando ocorre, tende a depender da ocorrência de eventos críticos que desestabilizam o arranjo vigente — surtos, efeitos adversos graves, mudanças no sistema de apoio — funcionando como perturbações externas ao equilíbrio.
Essa análise revela que a chamada "estabilidade de saúde mental" sustentada por tratamento contínuo com psicofármacos, longe de ser apenas uma condição médica ou neuroquímica, é também o resultado de uma articulação comportamental complexa entre múltiplos agentes e reforçadores. Identificar esse padrão pode abrir espaço para intervenções que considerem não apenas os sintomas, mas as condições relacionais e funcionais que mantêm determinados comportamentos, possibilitando a construção de novas formas de cuidado mais sensíveis à autonomia e ao contexto de vida do sujeito.